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Estou cansada.
A insónia não me tem dado tréguas.
Normalmente acordo cerca das 5 / 6 da manhã e ali fico, a virar e revirar na cama, à espera de voltar a adormecer. O que raramente acontece, sem que tenha passado, pelo menos, uma hora de reviravoltas.
Deito-me mais cedo e a chegada da insónia antecipa-se também. Tornando a noite infinitamente longa.
Frequentemente - lembro-me agora - a insónia sobrevém uma aparição tua num qualquer sonho.
Talvez seja isso que me mantém acordada. O medo de voltar a sonhar contigo.
Ou o medo de me esquecer de ti. Das tuas feições. Das tuas mãos. Do teu cheiro.
Sim, já tive sonhos em que te cheirei de novo. As memórias soltam-se mais à noite, assaltando os sentidos oníricos.
Tenho saudades.
Precisava que te sentasses ali, no sofá, ao meu lado. Que me passasses um braço sobre os meus ombros, e a minha cabeça pousasse no teu peito, a ouvir o coração a bater.
Mas esse é um som do passado, não é verdade?
Ou então não são saudades, mas apenas cansaço.
Sinto-me tão cansada que, por vezes, me parece que vou desistir.
Que me apetece sentar naquele mesmo sofá e deixar-te partir.
Definitivamente. Seja lá isso o que for.
Já te contei que o céu estava hoje rosado como tanto gostas?
Quiquera
Disseste-me um dia, zangado, que o meu problema era falta de sonho.
No momento brinquei que estavas errado, que o meu problema era, sim, falta de sono.
Mais tarde, já sem ti, sentei-me a pensar no assunto.
Não sei se me doeu mais a crueza das palavras ou o constatar da realidade: não me conhecias de todo
Das horas livres do meu dia, mais de metade são passadas a sonhar acordada. Sonho com o que pode acontecer e o que não pode. Com amor, trabalho, viagens, sonhos variados em vários tons de realidade.
Se até sonhei contigo!
De noite, meu cérebro não dá descanso e os sonhos sucedem-se, ora caóticos, ora clarividentes.
Também aí sonhei contigo.
Assim, durante cerca de 50 anos.
Acho que hoje te posso responder: meu problema não é sonhar pouco, é sonhar demais.
O teu, é não estares preparado para os sonhos que alimento.
Não sonhamos juntos, enfim.
Este último ano e meio parece ter roubado grande parte da energia que tinha.
Por vezes penso tratar-se de uma reacção à pandemia, outras de uma crise de meia idade.
Sim, as mulheres também as têm. E, como aos homens, pode dar para várias coisas. Comprar um carro desportivo, largar o marido por um homem mais novo, ficar quieta.
No meu caso, nunca me deu para pensar em carros desportivos. Estão longe do meu gosto. E do meu bolso.
Largar o marido, também não é opção. Primeiro tinha que o ter... E o trabalho que daria um homem mais novo!! Já não tenho unhas para essa guitarra.
Portanto, fico mais quieta.
Sinto-me sem energia, cansada das dificuldades da vida.
Fartíssima desta pandemia, dos números, dos pânicos, do "ora abre, ora fecha", das desconfianças e dos medos.
Então, deixo-me ficar quieta.
Na secretária, amontoam-se as tarefas que esperam, mesmo as que têm prazo marcado, as cartas que esperam resposta (desculpem os que aguardam)...
Mas, curiosamente, não me decido a deixar tudo, deitar tudo fora, e deixar-me ficar quieta de vez. Parece-me que seria desistir de quem sou.
Assim, vou estando neste limbo anérgico, que faz jus à resposta padrão portuguesa:
"Como estou? Olha, vou andando".
Quiquera
Há muitos, muitos anos (talvez uns 25 anos) iniciei uma bucket list.
Aliás, várias, separadas por temas: viagens a fazer, desafios a cumprir, objectivos, sonhos tontos, sei lá...
Ao longo dos anos fui actualizando, acrescentei itens, retirei outros - cumpri alguns desejos.
Deixei o papel e passei tudo para um ficheiro, que passou de computador para computador.
Com os anos, os eventos de vida foram empurrando as listas para o esquecimento.
Hoje, ao procurar um ficheiro antigo, reencontrei-as, esquecidas numa pasta com o nome de "suspensos".
Resolvi relê-las. Perceber que não havia nada de novo para marcar como feito, não foi uma surpresa.
Depois, num jogo de "dedo na ferida", comecei a marcar aqueles objectivos que já não têm possibilidade de acontecer.
Aos poucos fui pensando que não importa, que é tempo de olhar para o feito e esquecer o que ficou pelo caminho.
Ainda não cheguei à aceitação plena. Não sei se alguma vez acontecerá.
Mas pronto. Encolho os ombros, volto ao trabalho e sigo em frente. Mais uma vez.
Gosto do jogo de sombras, que por vezes o sol me oferece.
A chávena na minha mão esconde, na sombra, o seu conteúdo. Deixa espaço aberto à interpretação da imaginação.
De uma sombra fazer uma história, criar um mundo e mergulhar nesse espaço, fazê-lo meu.
Para mais tarde, me esconder na realidade, lembrando sombras que me levaram para longe de mim.
Quiquera